cotidiano e afins

Auto-engano

Me lembro como se fosse hoje eu sentindo aquela indignação toda, foi tanta que não me contive e te disse que não esperava nada de você. E isso gerou um mal estar tão grande em mim. Como se nosso encontro tivesse deixado de fazer sentido, como se no final tivesse ficado só isso, essa falta de sentido e aquele beijo seco da despedida... E eu querendo me enganar. Só hoje, somente hoje me dei conta da verdade. Não que eu não soubesse a verdade, eu sabia, eu soube todo o tempo, mas como ela machuca... mentir faz doer menos e escrever me livra das dores, estou fugindo de novo através das palavras, ao menos através delas posso ser sincera, posso ser eu, ainda eu seja nada, vazia, ainda que eu seja ilegível... Me dei conta depois do fim de semana na praia em que eu fui tão feliz, tão feliz que nem sei dizer o quanto, fui tão feliz de estar com pessoas que eu amo tanto e estando feliz me lembrei de você, na alegria... e não tendo mais como fugir eu tive de encarar a verdade: eu espero tanto de você, desde o instante em que eu te vi eu espero de você tudo, espero saber cada coisinha sobre você, espero te dar cada alegria que eu puder, espero aproveitar cada pedacinho do seu corpo e da sua alma e da sua vida... espero tanto de você e eu sei que você não tem nada pra me oferecer. E então eu entendi que sentir isso é como querer comprar o carro dos seus sonhos, aquele mais bonito, mais grande, mais bem equipado, aquele que você tem até dinheiro pra comprar mas... mas não cabe na sua garagem e você não pode mudar de casa, não faz sentido comprar um carrão assim pra guardar do lado de fora... é assim que me sinto... não faz sentido estar com você se é pra ficar do lado de fora. Eu não caibo na sua vida, não tem lugar pra mim ao seu lado, nem com sua família, nem com seus amigos... se nos perdêssemos numa ilha deserta por certo seríamos felizes, no entanto, não há ilhas desertas mais, na nossa idade as ilhas são todas povoadas de tantas tragédias, de tantos desencontros, de tantas desilusões... Eu queria continuar mentindo e te encontrar e aproveitar um pouquinho de você... mas meu caro, faz sentido ser feliz sendo outra? Se eu agir assim, como um canalha age, com essa máscara que eu vesti quando te disse não esperar nada de você eu poderia ser feliz?? Penso que a felicidade não deve custar a dignidade de ninguém, principalmente a própria. E penso também que abrir mão de sermos nós mesmos jamais nos tornou felizes. É só isso que sou e o que posso oferecer é bem pouco, ofereço o que sou.

postado por Shirley Suely @ 9:42 PM